2 Anos trazendo a lógica!!

Teses e Comparações

Lindemberg e Edward Cullen.

Alves só dizia: “Quero Eloá. Eu amo a Eloá. Ela é tudo em minha vida”. (Folha, 19/10/2008)

“Well, I wasn’t going to live without you.” (New Moon, página 19)

 

Antes de qualquer coisa, sim, concordo com todos vocês: já enchemos a bola desse bababa obsessivo pela ex-namorada demais com todo aquele sensacionalismo que os jornais da tarde nos transmitiram – Sônia Abrão que o diga, demonstrando seu esplêndido (não) treinamento em negociações ao falar com ele – durante o que foi considerado o cativeiro mais longo da história de São Paulo.

Contudo, após me obrigar a ler Crepúsculo, e após observar atentamente o comportamento de inúmeras garotas apaixonadas e  desmioladamente histéricas pela série, não pude deixar de notar a semelhança entre esses dois… Er, bem, acho que posso chamá-los de homens, certo? Por mais que um seja um covarde psicopata e o outro seja um vampiro-lamparina… Oh, well.

E, por incrível que pareça, as semelhanças são grandes. E perturbadoras, ainda mais se considerar o número de garotas que querem um “namorado ideal” como esse.

 

 

A Falta da Individualidade.

Em geral e, infelizmente, isso costuma aparecer bastante, tanto na vida real quanto em romances atuais. Parece que, em um romance, o importante é que o “amor” seja tão intenso ao ponto de que não se exista mais “eu” ou “você”, mas que as duas partes se tornem apenas uma. Torna-se quase impossível pensar por si, agir por si, ou fazer qualquer coisa que seja individual. A importância é a nova unidade, os “dois que formam um” onde, caso não exista isso, seja possível “a coisa andar para frente”.

Sua opinião não importa. O que importa é o casal… Não é nem se sua contraparte está feliz. O que importa é a unidade. Fim de história.

Partindo dessa base, essa é a primeira semelhança que encontrei entre o casal-real e o casal-ficção. Ironicamente, tirei essa conclusão justamente graças ao comentário de uma Lover, há uns dois dias, no chat.

Por bons motivos de falta de memória, não citarei nomes. Será Hater e Lover.

 

Lover: Mas como isso pode ser um amor-egoísta? Edward disse que não conseguiria viver sem a Bella.

Hater : Ele tinha vivido 108 anos antes sem ela. ‘-‘

Lover: Não, Edward não vivia, porque ele vive por Bella. Antes, ele apenas existia. Foi Bella que preencheu sua existência vazia.

Oh, bem. Isso foi romântico. Uma gracinha. Edward Cullen era apenas um pontinho cinza durante um pouco mais de um século, até que um pontinho retardado e colorido como a Bella aparecesse para preencher sua vazia existência. Essa história do homem frio e estóico encontrar a alegria em um rabo de saia  uma garota sempre faz com que meninas suspirem por todos os lados e tudo o mais – COF Sasuke e Sakura COF. De fato, na ficção é uma graça.

Agora analisemos a vida real:

 

“Eloá não poderia deixar Lindemberg porque Lindemberg jamais poderia deixar Eloá . Lindemberg hoje vive, mas não existe, como não existia antes de conhecer Eloá.” – Pensando Alto sobre Educação (http://miriamstolear.blogspot.com/2008/11/elo-e-lindemberg.html)

 

Foi bem surpreendente na hora em que li essas palavras. Na verdade, parece até que a ironia sorriu para mim – e que sorriso bonito, devo acrescentar. Quero dizer, todo mundo não achou lindo essas palavras a respeito de Edward e Bella? Por que com Lindemberg seria diferente? Só por que ele não tem um Volvo e não é estupidamente pálido?

Oh, puh-lease.

A verdade é, o fundo psicológico dos dois é o mesmo. Ambos amam suas namoradas ao ponto de não serem capazes de viver sem elas. Ambos não eram mais uma pessoa, um individuo, mas seres que viviam única e exclusivamente em prol da unidade, o casal.

 

 

“Eu mando, você cala a boca e obedece”

 

Okay. Crucifiquem-me, lovers, mas a verdade é: se Edward mandasse Bella saltar do Cristo Redentor, ela faria. Ele não queria que ela fosse amiga de Jacob, ela não foi. Ele não queria que ela fizesse tal coisa, ela não fez.

Como dito em alguns dos posts aqui, Meyer construiu a imagem de um relacionamento patriarcal, em que o homem não vê sua parceira como igual, mas como uma criança que deve ser ensinada e alertada sobre o que é certo e o que é errado. Diversas vezes eu quis jogar o notebook pela janela e afogar a cabeça no vaso sanitário com a capacidade de Bella de ser um capacho completo do vampiro-lamparina – e por ela ter a total falta de amor-próprio, mas enfim.

Mas, vamos por partes.

Por mais que o romance seja retratado do ponto de vista da Bella, dando a entender que ela é a personagem principal de toda a “obra”, fica óbvio a todo mundo – ou pelo menos eu espero que seja – que a grande estrela – literalmente – de todo o romance é o Edward. E, pasmem Haters, NÃO É por causa de seu corpo estupidamente brilhante.

Mas, bem, vamos dar o braço a torcer: o homem movimenta todas as peças como se fosse um controlador de marionetes – ele só não ganha o Achmed, koe. E, acima de tudo, sua melhor marionete é Bella. Como bom macho dominante (não), Edward vai mostrando quem manda na relação e vai fazendo com que Bella dance conforme o ritmo da música que ele escolhe.

Em geral, esse tipo de manifestação de controle num relacionamento determina o medo da pessoa controladora em perder a pessoa controlada. Há aqui a necessidade de mostrar QUEM comanda, e QUEM obedece.

Bem, mas as meninas insistem em dizer que Edward sabe o que faz, que quer o melhor para a Bella e blábláblá. Por isso que não a deixou ser amiga de Jacob, ou qualquer coisa do tipo.

Vamos para nossa estrela obsessiva e real.

De acordo com depoimentos prestados à sensacionalista mídia, Lindemberg era controlador. Eloá via quem Lindemberg quisesse, falava com quem ele quisesse e fazia o que ele quisesse. Tudo porque, de acordo com os padrões (que até hoje eu não faço a menor idéia quem abitolou isso nas nossas mentes), ele era mais velho e, consequentemente, mais experiente – COFEdwardCOF. Afinal, ele saberia o que seria melhor a jovem e inocente Eloá, que ainda descobria os prazeres do mundo ;D

Lindemberg era controlador. Edward era controlador.

E ambos achavam que sabiam o que era melhor para manter a “unidade” intacta.

A única diferença que eu vejo aqui são as mocinhas, no caso: Eloá quis se libertar do relacionamento controlador, obsessivo e egoísta. Bella achou que isso era amor.

 

 

A beleza de se observar o ser amado seguro

 

Outra coisa que escutei as meninas ficarem histéricas a respeito da saga de Desmiolada Meyer são aquelas partes em que Edward observa sua amada dormir.

Oh, well. Isso é romântico, certo? Quem não gostaria que seu namorado/marido/ajuntado observasse amorosamente enquanto você provavelmente está se afogando na própria baba, no décimo quinto sono? Não, sem ser irônica, é bonito. É uma graça. Ele fica observando cada detalhe de seu rosto, cada gesto que você faz enquanto dorme, qualquer coisa do tipo. É encantador.

Mas e quando ele invade seu quarto no meio da noite para fazer isso? Continua sendo romântico? Quero dizer, vamos ignorar uma lei óbvia que diz “INVASÃO DE PROPRIEDADE” por um momento e pensar isso apenas pelo lado sentimental e romântico.

Bem, vamos ser sinceros:

NÃAAAAO!

De verdade, se eu tivesse um namorado que dá uma de homem-aranha e vai para o meu quarto apenas para me observar dormir e, eu descobrisse isso, ia ficar profundamente aterrorizada! Meu chapa, sério, isso é obsessão! Não tem nada de bonitinho e iluminado numa situação como essas.

Mas, bem, as meninas acham isso lindo. Porque é Edward Cullen, e Edward Cullen pode fazer isso.

E nossa estrela do cativeiro?

 

“Wellington Roberto Campelo, vizinho de bloco da Eloá Pimentel e amigo de Lindemberg Alves há mais de 10 anos, afirmou que o rapaz vigiava a saída da menina do colégio todos os dias.” (Portal Terra, 21/10/08)

E aí? Você acharia bonitinho também que seu namorado a vigiasse na escola? “Liso” também gostava de observar sua namorada, certificar que estava tudo bem – e que não existia nenhum macho querendo roubar seu posto de controlador-mor.

Bem, aposto que você deve estar pensando que Lindemberg era obsessivo em relação a sua namorada e que, obviamente, possua sérios transtornos psicológicos, certo?

Então por que diabos com Edward o negócio passa a ser romântico e bonitinho?

Mas lógico. Não tem nada a ver invadir o quarto da sua namorada para observá-la dormir e vigiá-la sair do colégio, certo? Uma coisa não tem nada a ver com a outra.

Porque vigiar namorada no colégio é para losers. Lamparinas com Volvo invadem quartos, koe.

É quase como um: WHATAHELL?

 

 

 

 

O amor egoísta

Eu REALMENTE não queria tocar nesse tópico, especialmente por ver brigas diárias a respeito desse assunto em diversos casais fictícios. Mas… Bem, dane-se.

Em poucas palavras, de modo explícito, afirmo: Edward Cullen e Lindemberg Alves baseavam-se em uma relação de amor egoísta. Não adianta nem vir com aquela história de “Edward não queria transformá-la em vampira por achar ISSO egoísta”, porque não cola. Não cola MESMO.

Esse tipo de amor é bem mais sutil do que parece, e chega muitas vezes conseguir se camuflar com sucesso sob as asas do altruísmo.

Mas retomando.

Edward Cullen era um homem solitário e que apenas existia, antes que Bella aparecesse e transformasse sua existência em vida, certo? De acordo com as palavras das Lovers, sim. Ao primeiro momento, novamente, isso é lindo, porque soa quase como a personificação perfeita do amor verdadeiro.

Então, com isso, assumimos que, o marco inicial de Edward é a aparição de Bella. Até então ele era apenas um homem solitário. Consequentemente, a solidão traz o tom vazio à vida de qualquer pessoa e, consequentemente2, faz que assumamos que Edward era uma pessoa vazia.

Só e vazio.

E aí Bella aparece e eles se apaixonam de uma forma completamente bizarra, mas ok.

 

“Assegurar-se de que o outro é um nada, é ter a certeza de que a solidão nunca chegará ao mesmo tempo em que sempre existirá.” (http://miriamstolear.blogspot.com/2008/11/elo-e-lindemberg.html)

Novamente, Edward chegava a fazer com que Bella fosse “nada” a partir do momento em que ela era tratada como a “criança que precisava aprender” e ele assumia o papel de “pai”. Ao mesmo tempo, Edward era um homem vazio e só, o que consequentemente pode ter guiado suas atitudes de modo que ele a controlasse e assumisse a posição de que fazia aquilo por amor.

Inconscientemente, ele protegia Bella para proteger a unidade e, ao mesmo, proteger a si mesmo de nunca mais ficar só.

Chamem-me de idiota, mas eu não vejo altruísmo nisso. Mas sim, um amor egoísta.

 

“O poder em mãos de alguém que nunca se sentiu alguém e o medo do vazio e da própria solidão , paralelos ao ódio de depender de alguém que será sempre um ninguém .” (http://miriamstolear.blogspot.com/2008/11/elo-e-lindemberg.html)

Ainda que Edward não tenha se sentido um “Zé-ninguém” ao longo da série, ele se assemelha a Lindemberg no sentido de solidão. “Liso” também sentia medo de ficar só, e suas atitudes se assemelham a Edward nos quesitos de controle e tudo o mais. Ele diz que agiu por “amor”, quando na verdade, agiu por ter medo de se sentir só novamente e por perder seu pilar, a unidade.

Novamente, amor é o sentimento que traz mais facilidade de disfarçar o egoísmo em altruísmo.

 

 

 

Considerações Finais

 

Aos Lovers, recomendo não me mandarem e-mails, vírus ou ameaças de morte. Tudo o que fiz foi para expor um ponto de vista sobre o que vocês consideram como homem perfeito. É minha opinião sobre o romance, sobre o personagem e a personalidade do mesmo. Não gostou? Oh, well… C’est la vie?

 

Ao mesmo tempo, provo a vocês que nem tudo está perdido: o homem perfeito que vocês tanto clamam pode estar por ai. Exatamente como Lindemberg esteve para Eloá. Só cabe a vocês verem a situação aos olhos de alguém que cedo ou tarde vai querer se livrar dessa obsessão (Eloá) ou vai achar isso lindo e maravilhoso e brilhante (Bella).

 

“A morte de Eloá, assegura ao algoz a certeza de que nunca viverá sem sua própria imagem. Matar a imagem é ter a certeza de que não será abandonado por si mesmo. Traído por si mesmo . É o fim da simbiose. É o fim do drama.”

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(Tamara)


O Lado Mais Obscuro de Crepúsculo

Racismo, Hierarquização e a Romantização de Relacionamentos Não Saudáveis

Texto: Ella, do Twilight Sucks

Tradução: Anísio e Jamille

Revisão: Giovanna

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A série de romance adolescente de Stephenie Meyer, conhecida como a saga Crepúsculo, é um fenômeno da cultura popular. Ao redor de todo o mundo, garotas estão se apaixonando por Edward Cullen, e pela estória de seu amor imortal por Bella Swan.

Entretanto, por trás da adocicada estória de amor de Crepúsculo, existe uma série de livros que reproduz paradigmas racistas, hierárquicos e sexistas, espalhando-os pela sua legião de jovens fãs pelo mundo.

Romances tem impacto sobre as expectativas e o comportamento de quem os consome. Eles apresentam a construção do homem ideal, do relacionamento ideal, e dos comportamentos esperados das mulheres nesses relacionamentos.

Em um estudo focado em universitárias, a pesquisadora Huei-Hsia Wu percebeu que “A maioria dos romances provem valores constrangedoramente patriarcais. Assim, a leitura de romances torna-se um modo de moldar a pessoa, a identidade sexual, e as atitudes e comportamento relacionados ao patriarcado” (Wu 2006).

O efeito dos romances não se limita às universitárias. Um estudo anterior, citado por Wu, evidenciou que “leitoras Indianas pensavam em romance fictício [Ocidental] como manuais modernos de sexualidade” (Paraneswaran 2002).

Atravessando países e culturas, romances servem como veículos que exportam uma idéia Ocidental e patriarcal de sexualidade. A série Crepúsculo é direcionada às leitoras jovens, cujos interesses e expectativas sobre o amor e relacionamentos ainda estão se formando. Sua influência se espalha em inúmeros países por conta de sua imensa popularidade.

De acordo com um artigo de Agosto no Roanoke Times, as séries tem 7.5 milhões de cópias impressas e foram publicadas em 37 países (Hutkin). Esses números são de antes do lançamento da última parte das séries, a qual vendeu 1.3 milhão de cópias no primeiro dia (Memmott). A adaptação cinematográfica do primeiro livro recebeu U$ 69.637.740 durante seu fim-de-semana de estréia (“Crepúsculo”).

Por causa de seu status como um fenômeno internacional, garotas no mundo todo ficaram encantadas com a série. Para muitas fãs, Edward Cullen é seu homem ideal, porque afinal de contas, Edward é “perfeito”. Mas o que exatamente significa ser “perfeito”?

Em termos de raça, perfeição, no mundo de Crepúsculo, significa ser branco.Os vampiros em Crepúsculo são descritos como ultra brancos e apresentados como uma raça superior: mais rápidos, mais fortes, e mais bonitos que humanos; basicamente melhores em tudo.

A própria Meyer já disse ser “anti-humanos”. Essa observação vindo em resposta às declarações de que os livros são anti-feministas porque Bella é fraca, a resposta de Meyer: ‘No máximo, sou anti-humanos”, implica que Edward é melhor que Bella não apenas por causa do gênero, mas porque vampiros são superiores a humanos. A aparência superior do vampiro é focada extensivamente no romance e é descrita como conexão por ser mais branco do que os humanos normais. Quando uma pessoa se torna um vampiro, eles se tornam extraordinariamente atraentes, e se são pessoas de cor, eles tornam-se brancos:

“Elas eram, sem sombra de dúvida, as três mexicanas mais bonitas que eu já vira na vida. Tinham pele tão clara que me lembro de me maravilhar com isso. Até a menina baixa de cabelos pretos, cujas feições eram claramente mexicanas, era de porcelana ao luar. (Meyer, Eclipse 213).

A garota mexicana é bonita porque tornar-se uma vampire permitiu-a parecer branca, implicando que ter pele de porcelana é linda e perfeita, enquanto ter a pele mais escura é inferior. Quando mulheres de cor lêem esse livro nos Estados Unidos ou em outros países, ele manda uma mensagem de que pessoas não-brancas são inferiores porque eles não parecem com os vampiros do romance. Leitores não-brancos não podem sequer se identificar com a protagonista humana Bella, cujas características foram deliberadamente vagas, para permitir que o leitor as justaponhas por si mesmo, porque a única coisa da sua aparência que é clara é que ela é branca.

De fato, todos no livro exceto os indígenas da reserva de La Push são brancos. Em contextos racistas, o grupo oprimido é geralmente apresentado como o “outro”, enquanto o grupo dominante é a “norma”. Nestes romances, os membros da tribo Quileute – os únicos personagens apresentados que não são brancos – são descritos como literalmente desumanos. Ao invés de serem seres humanos, “as lendas contam que (a tribo Quileute) descende de lobos” (Meyer, Crepúsculo 124).

Porque são descendentes de lobos, todos os persogens principais que são nativo-americanos são lobisomens. As únicas minorias presentes na série são literalmente uma espécie a parte, o que sugere que quem não é branco é menos que humano. Além do mais, apesar de vampiros e lobisomens serem desumanos, os lobisomens são mais selvagens que vampiros. Edward se opõe à proximidade de Bella a Jacob porque lobisomens podem facilmente perder o controle de si mesmos. Os indígenas de peles escuras não podem controlar seus desejos mais profundos, enquanto o super vampiro branco pode. Apesar de nunca atacar Bella na forma de lobo, Jacob abusa sexualmente dela ao forçar um beijo, personificando o estereótipo do agressor sexual de pele escura. Novamente, isso constrasta com Edward, que é casto até seu casamento com Bella, e nunca perde o controle por causa de seus desejos sexuais.

No geral, a série Crepúsculo define normalidade nos termos de se ser branco, e perfeição nos termos de ser ainda mais branco, enquanto apresenta pessoas de cores diferentes como inferiores e desumanas, alimentando diversos estereótipos racistas.

Não é de se surpreender que as minorias inferiores são mostradas vivendo em pobreza, enquanto os vampiros brancos aproveitam de uma riqueza obscena. A casa de Jacob Black é descrita como “uma casinha de madeira com janelas estreitas, a tinta vermelha desbotada deixando-a parecida com um celeiro minúsculo.” (Meyer, Lua Nova 112).

As palavras “casinha”, “estreitas” e “minúsculo” enfatizam que a casa não é ampla. A descrição da tinta como “sombria” sugere que esta encontra-se envelhecida. O uso da palavra “celeiro” implica que o local é mais adequado para animais do que para pessoas. Isso é um contraste agudo à casa dos Cullen, que “tem uma leve pintura de branco, três andares retangulares e bem divididos.” (Meyer, Crepúsculo 321).

Até a casa dos Cullen é descrita com termos de brancura, assim como o nome dos personagens líderes da minoria são descritos com termos de conotação de pele mais negra. Além disso, pobreza é apresentada como uma norma da minoria, enquanto extrema riqueza é outro traço que faz dos Cullen superiores aos outros no romance.

Em termos de classe, riqueza é relacionada a perfeição na série de Crepúsculo. Antes de Bella sequer conhecer Edward, ela repara no automóvel caro dele. “O carro mais legal era um Volvo brilhante, e ele chamava a atenção” (Meyer, Crepúsculo 14). O carro diferencia Edward de todas as outras pessoas de Forks porque ele e os demais Cullen são mais ricos que elas.

Conforme a história se desenrola, fica claro que os Cullen são mais ricos do que a maioria das pessoas em geral. Eles são donos de uma ilha no litoral da América do Sul e são capazes de comprar produtos que não são acessíveis ao público em geral, como uma TV de tela plana que foi apenas lançada na Coreia e uma Mercedes de luxo que “nem saiu na Europa ainda” (Meyer, Breaking Dawn 6).

Claramente, os Cullen são da classe social mais alta imaginável. A classe alta os faz mais superiores que até mesmo os outros vampiros. Os vampiros maus de Crepúsculo, os nômades, são descritos como vestindo “roupas… rasgadas… gastas, e [estando] descalços”.

Ao contrário dos Cullen, os nômades não possuem nada, e suas roupas sugerem que não tem riquezas materais. Enquanto os ricos Cullen são civilizados e bons, tais vampiros são assassinos selvagens. Logo, bens materiais são associados à bondade e à civilidade, enquanto a falta de riqueza é apresentada em um contexto de selvageria e maldade.

Ao longo da História, classes mais baixas tem sido apresentadas como imorais. Essa visão tem sido utilizada para justificar a opressão sistematizada por parte das classes dominantes no papel de seus superiores morais. A saga de Crepúsculo reproduz os mesmos paradigmas hierarquizantes, demonizando classes mais baixas enquanto exalta os ricos.

Mesmo a construção de raça e classe em Crepúsculo sendo perturbadora, o centro da série é o romance entre Bella e Edward. A construção de gêneros na série é de suma importância ao examinarmos o que a série de livros apresenta como romance perfeito. O relacionamento ideal mostrado por Crepúsculo não é saudável, é caracterizado por abuso, controle e obsessão, e o gênero é construído em termos de que homens são como figuras paternas e mulheres, crianças dependentes.

As bases do ‘amor’ de Edward e Bella um pelo outro são a obsessão e paixão cega. Edward persegue Bella, entrando em seu quarto para vê-la dormir sem que ela saiba, antes de eles começarem a namorar. Bella está tão obcecada por Edward que quando ele a deixa em “Lua Nova”, ela torna-se catatônica por quatro meses, e então começa a pôr-se em perigo, para que possa ter alucinações com a voz dele.

No seu livro ‘Mas Eu O Amo: Protegendo Sua Filha Adolescente de Relacionamentos Abusivos e Controladores (But I love him: Protecting Your Teen Daughter From Controlling, Abusive Dating Relationships), a psicoterapeuta Dra. Jill Murray descreve esse tipo de relacionamento como “viciante”. Em Crepúsculo, Edward chama Bella de sua “dose de heroína” (Meyer, Crepúsculo 268), uma frase imortalizada por muitas fãs, que a acham romântica. O relacionamento também é literalmente discutido em termos de vício em Eclipse, quando Bella diz o porquê de amar Eward mais que a Jacob.

Além de ser um relacionamento doentio baseado num vício obsessivo, o relacionamento de Edward e Bella exibem vários sinais de abuso emocional. A Dra. Murray descreve esses sinais em seu livro, e eles incluem: a mulher tendo seu tempo monopolizado, isolamento dá família e amigos, dizer “eu te amo” cedo demais, destruição/roubo de objetos queridos, manipulação e interrogatórios.

Edward Cullen apresenta todos esses comportamentos.

Bella e Edward passam juntos todo o tempo que tem. Bella passa a não se interessar mais em passar tempo como seus amigos humanos ou com sua família porque quer ficar com Edward. Bella e Edward declaram o amor que sentem um pelo outro no primeiro encontro, sendo que eram amigos há menos de uma semana.

Em Lua Nova Edward invade o quarto de Bella e rouba vários de seus pertences. Edward também ameaça se suicidar porque não pode viver sem Bella, em Eclipse, e sua a transformação em vampira para manipular Bella a se casar com ele, entre várias outras formas de manipulação. Finalmente, em Eclipse, ele faz mais do que interrogar Bella por visitar Jacob, impedindo-a de fazê-lo ao providenciar que sua irmã a capture e vandalizando o caminhão dela para impossibilitá-la de visitar o outro rapaz.

Todo esse comportamento é dado como o epitome de romance.

O comportamento de Edward é justificado nas series porque ele faz o que é melhor para Bella, e se encaixa no papel dos gêneros construídos no romance. Na série Crepúsculo, as mulheres assumem o papel de crianças, e os homens de seus pais, que protegem e servem como figura autoritária.

De fato, alguns dos relacionamentos “ideais” apresentados no romance são literalmente como a de um pai para uma filha. A relação entre o adolescente Quil e Clair é maravilhosa porque, para ela, semear amor pelo costume o fará “tornar-se o que ela precise que ele seja; seja um protetor, ou um amante, ou um amigo, ou um irmão. Quil será o melhor, o mais gentil irmão que qualquer criança já teve… E mais tarde, quando ela for adulta, eles serão felizes… Ele será o par perfeito.” (Meyer, Eclipse 132-133)

Presume-se que a relação de Jacob com o então nascido bebê Renesme será similar. Um par perfeito, no mundo de Meyer, é alguém que funciona como uma figura autoritária mais velha. A mesma dinâmica aplica-se a Edward e Bella, onde Edward, que é quase um século mais velho que Bela, de muitas forma funciona como um pai para ela. Ele a força a matricular-se em certas faculdades, controla o que ela faz e quem ela vê, para o próprio bem dela, e deseja dar-lhe conforto financeiro em forma de coisas caras e oferecendo-se para pagar pelo seu ensino superior.

Em ambos os casos dos protagonistas e do “par perfeito” criado através de um costume, o romance é apresentado em termos de construção de gênero onde a mulher é mais ingênua e o homem, mais parternal.

A Série Crepúsculo é considerada por vários fãs a maior história de amor já contada. Seus interesses amorosos, Edward Cullen e Jacob Black (que ao final da série se apaixona – via imprinting – com um recém-nascido) são os namorados fictícios dos sonhos que muitas meninas mundo afora desejam ter. Essas jovens leitoras moldam seus desejos e expectativas de acordo com o que é apresentado nos livros.

O resultado: essas jovens mulheres podem inconscientemente adotar as visões racistas, hierarquizantes e sexistas que estão contidas neles. Muitas fãs se recusam a ver falhas nos livros e em seus protagonistas do sexo masculino, e é aterrorizante pensar no efeito que isto pode ter nos relacionamentos futuros delas.

Texto Original: http://twilightsucks.proboards.com/index.cgi?board=twilight&action=display&thread=5480&page=1